ibama completa 30 anos com derrubada ambiental em curso
- Turma Jornalismo Impresso
- 18 de jun. de 2019
- 13 min de leitura
Atualizado: 1 de jul. de 2019
Os cortes no órgão e o retrocesso nas políticas ambientais brasileiras derrubam os muros de proteção à natureza e biodiversidade do país

A verba do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) foi cortada em 24%. 21 dos 27 superintendentes foram demitidos (entre eles, o fiscal que autuou Jair Bolsonaro quando ele, em 2017, foi multado por pescar em área ilegal) e substituídos por policiais militares do estado de São Paulo sem histórico na área ambiental. Com isso, o Ibama se tornou o órgão que mais exonerou pessoas na história da Esplanada.
FUNÇÃO DO IBAMA
O órgão é uma autarquia federal vinculada ao Ministério do Meio Ambiente. Seus fiscais atuam com poder de policia ambiental - a maioria oceanógrafos, biólogos, engenheiros florestais, de pesca e até publicitários. Todos precisam fazer o curso superior de 45 dias do Grupo Especializado em Fiscalização do Ibama (GEF) que é semelhante ao treinamento do BOPE, no estilo “pede pra sair”. Os que não aguentam os testes físicos e de resistência são eliminados.

Essa “tropa de elite” fiscaliza o cumprimentos das leis ambientais em todo território nacional. Os policiais realizam operações em campo onde, via satélite, são apontadas áreas protegidas sendo desmatadas, queimadas, garimpadas ou sofrendo qualquer tipo de degradação.

O Ibama também é responsável por combater o tráfico de animais silvestres no Brasil, que é o maior do mundo. Esse mercado movimenta mais de 1,5 bilhões de dólares por ano no país - perde apenas para o comércio ilegal de drogas e armas.
Eles trabalham com helicópteros e armas, o que os diferencia de uma forca tática da policia tradicional. Em 2008, o órgão foi autorizado, por meio de decreto, a destruir e queimar equipamentos usados para crimes ambientais. Segundo Roberto Cabral, ex-coordenador do GEF e ex-professor de biologia,
“o grupo é acionado para as missões mais espinhosas em áreas protegidas, principalmente ao longo do arco do desmatamento da Amazônia Legal - imensa faixa de terra que vai do Maranhão a Rondônia.Nessas áreas inóspitas de mata fechada se escondem garimpeiros e madeireiros armados. A gente não lida apenas com pessoas que cometeram uma irregularidade ambiental. São bandidos, criminosos”.

Em 2015, em uma operação na Terra Indígena Arariboia, no Maranhão, o ex-coordenador foi baleado com um tiro de espingarda de caça e os estilhaços de chumbo se alojaram em seus braços, ombro e tórax.
“Os helicópteros também são frequentemente atingidos, e muitos dos integrantes sofrem com o esforço fisico das longas caminhadas carregando equipamentos que pesam ao menos 12 quilos, fora o colete a prova de balas. Na volta das operações, rotineiramente ao menos três precisam ser operados por romperem ligamentos”, completa Cabral.

Não é a toa que o Brasil lidera o ranking mundial de maior assassinatos a ambientalistas - segundo a ONG Global Witness, dos 207 mortos no planeta em 2018, 57 foram no Brasil.
Já os servidores técnicos que trabalham nas sedes do Ibama em São Paulo e Brasília são responsáveis por monitorar e editar normas e padrões da qualidade
ambiental, criar campanhas de conscientização e elaborar sistemas de informação, que, pela Lei de Acesso a Informação Ambiental - vanguardista no planeta, criada em 2003, oito anos antes da Lei de Acesso a Informação - precisam ser públicas.
INDÚSTRIA DE MULTAS E CORRUPÇÃO NO IBAMA
Durante sua campanha eleitoral, Bolsonaro afirmou que iria acabar com a “farra do Ibama”, definindo o órgão como “uma fábrica de multas” - embora a legislação seja extremamente benevolente com os infratores. Segundo José Carlos de Carvalho, ex-ministro do Meio Ambiente no governo FHC,
“quando dizem que existe uma indústria de multa, é porque antes teve uma industria de infração a lei. O infrator tem direito ao chamado duplo grau de jurisdição no recurso administrativo. Ele recorre uma vez, e em tendo seu recurso negado, recorre uma segunda. E quando - sobretudo os grandes poluidores - perdem no segundo grau, recorrem as calendas do judiciário brasileiro. Aonde (as multas) ficam lá e não são pagas porque estão em grau de recurso com suspensão de recurso. Não é por acaso que apenas 5% das multas são pagas. Porque isso ninguém menciona: que industria de multa é essa que ninguém paga?”

Felipe Werneck, ex-assessor do Ibama por quatro anos e exonerado em março, explicou que o órgão foi criado em 1989 pela fusão de vários outros órgãos, e com isso entraram muitas pessoas despreparadas.
“Realmente (o Ibama) começou bagunçado, mas o governo Lula especializou o Ibama através de concursos, profissionalizou os intendentes - que precisam renovar seus cursos constantemente - e criou o GEF. Desde que eu entrei, em 2015, o Instituto era completamente técnico, organizado, focado e moderno em tecnologia. Todas as pessoas que estavam lá, trabalhavam realmente por paixão, disposição e dedicação a importância do Ibama.”
Werneck foi por mais de 30 vezes a Amazônia e levava até a imprensa para acompanhar as operações. Ele afirmou que a assessoria focava muito na transparência e no interesse público. Completou dizendo que o trabalho no Ibama foi o melhor de sua vida.

EXTINÇÃO DO MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE
Durante o período de transição, Bolsonaro considerou extinguir o Ministério do Meio Ambiente e acoplá-lo ao da Agricultura. O presidente voltou atrás na decisão porque os integrantes do agronegócio moderno alegaram que a junção seria prejudicial para suas exportações - já que os principais países consumidores possuem leis rígidas quanto a sustentabilidade de suas importações. O MAPA indicou Ricardo Salles e Bolsonaro acatou a nomeação.
Abaixo, vídeo gravado em 13 de dezembro - um dia após a nomeação de Salles - pelo deputado do PSL Frederico D"Avila, lider do agro, com o Ministro e Nabhan Garcia, presidente da UDN (União Democrática Ruralista)
HISTÓRICO DE SALLES
Ricardo Salles, do partido NOVO e fundador do movimento Endireita Brasil, é formado em direito pela Mackenzie e foi Secretario Estadual do Meio Ambiente em São Paulo durante o governo Alckmin, em 2016.
Ele se tornou réu em dezembro de 2018 por improbidade administrativa: Salles foi acusado pelo MP de fraudar o processo do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental do Rio Tietê durante seu cargo. De acordo com o MP, ele modificou mapas elaborados, alterando decretos do plano de manejo com o propósito de beneficiar setores econômicos e empresariais de mineração.
Salles foi suspenso de seus direitos políticos por três anos, além do pagamento de multa civil no valor equivalente a dez vezes sua remuneração mensal recebida quando secretário. O Ministério Publico divulgou, em um texto, que “Salles violou os princípios constitucionais administrativos da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade.” O ministro nega as acusações e ainda está recorrendo.
Em 2012, Ricardo Salles publicou um artigo na Folha de São Paulo intitulado "Privatização, ainda que tardia". O texto encerrava com sua biografia resumida em uma linha: Ricardo Salles, 36, mestre em direito público pela Universidade Yale, é advogado e presidente do Movimento Endireita Brasil.
A formação em uma das melhores universidades do mundo acabaram sendo incorporadas ao currículo de Salles por reportagens, jornais e programas durante anos. Mas, segundo investigação do The Intercept, a informação é falsa.
A reportagem entrou em contato com Yale, e receberam a seguinte resposta do representante da universidade por e-mail:
“Oi. Sinto muito pela demora na resposta. A Faculdade de Direito não conseguiu localizar nenhum registro indicando que Ricardo de Aquino Salles frequentou a Faculdade de Direito de Yale”.
O The Intercept também perguntou ao Ministério do Meio Ambiente qual o ano de formatura na Universidade de Yale e o títuto exato que consta no diploma.
Mas não tiveram resposta.
O currículo de Salles que está publicado no site do MMA não consta nada referente à Yale.
CENSURA E FALTA DE DIÁLOGO
O Ministério do Meio Ambiente impôs em março, segundo reportagem do Estadão, “a lei da mordaça” ao Ibama e ICMBio. Agora, qualquer pedido de informação aos órgãos precisa ser primeiro encaminhado à pasta.
Werneck pediu demissão de seu cargo como assessor no dia 12 de março porque garantiu que "o que vem pela frente é desolador". No dia 13, o anuncio de censura foi emitido.
“Se em seis meses de gestão o Ibama, outros órgãos e a política ambiental como um todo foram desmontados, o que esperar ao final dos quatro anos? Tenho medo até do que vem após, já que tivemos décadas de ditadura e o governo, por estar sendo militarizado, é simpatizante dessa época”.
Werneck está se mudando para a Alemanha em julho com sua mulher e seus filhos.
Nos últimos 3 meses os dados ambientais que estavam disponíveis em sites de órgãos públicos foram reduzidos em 30%, principalmente os mais relevantes sobre a Amazônia. Desde janeiro, das 41 informações-chave sobre o meio ambiente - de acordo com a Lei de Acesso a Informação Ambiental - só restaram 9.

Reportagens produzidas pelo departamento de comunicação e mapas de áreas prioritárias para a conservação e biodiversidade no país foram apagadas do site do
Ministério do Meio Ambiente, do Ibama e do INPE.
O pedido foi feito pela secretaria executiva da pasta, Ana Maria Pellini, que não quis se pronunciar à imprensa. O INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) controla desde 1961 toda a extensão do território brasileiro via satélite e divulga mapas e dados ambientais através de imagens.

Desde janeiro, quando se tenta acessar as páginas do site do Instituto, aparece “página não encontrada”. Essas imagens eram base para a criação de novas Unidades de Conversação e orientação de pesquisas.
Salles anunciou recentemente a obrigação do Ibama emitir comunicado de aviso prévio sobre operações de fiscalização contra desmatamento e garimpo, começando pelo Pará. Segundo Cabral,
“as operações funcionavam exatamente por conterem o “elemento surpresa”, e agora, além dos infratores poderem fugir, podem organizar retaliações e ataques muito maiores contra os fiscais”.

Edson Duarte, o último ministro a frente do MMA, revelou que foram surpreendidos quando, o primeiro comunicado que receberam, foi de que não deveriam passar nenhuma informação para a equipe de transição.
“Uma transição seria extremamente necessária para aqueles que estavam chegando. Foi a primeira vez na história que os atores que estavam chegando a um ministério se negaram a pegar qualquer informação, e o material que preparamos ficou em cima da mesa. Ninguém foi buscar.”
Izabella Teixeira, ex-ministra do MMA nos governos Lula e Dilma, criticou a falta de diálogo com a sociedade. Não há politicas públicas e de desenvolvimento sem diálogos, e quem é eleito na democracia, precisa dialogar.
"Não só dialogo virtual, como vemos hoje, mas físico também, porque a palavra precisa ser cumprida. Legados dialogam com o futuro. As escolhas que fazemos hoje o determinam.
Essa falta de diálogo também está associada ao enfraquecimento do Ministério das Relações Exteriores - não se faz política ambiental sem o Itamaraty forte. E isso apequena o Brasil em razão da complexidade das discussões climáticas em organismos globais, como a ONU.

O Ministério do Meio Ambiente bloqueou contas de ONGs, como Greenpeace e Observatório do Clima, em suas redes sociais do Instagram e Twitter.
Salles também bloqueou de sua conta oficial e pessoal - a qual ele mesmo administra - essas entidades e até pessoas físicas, como eu, estudante de jornalismo.
Questionado por mim, através de ligação para seu gabinete - na qual foram necessárias 13 tentativas, o ministro disse que “bloqueia quem incomoda e causa baderna.”
Em resposta à uma reportagem do Estadão, Salles também confirmou:
“Sobre [o bloqueio de] pessoas físicas, não sei te dizer [se estão ligadas a ONGs], pois quem escreve ofensas eu bloqueio, mas o perfil desse Observatório do Clima, sim, eu bloqueei, porque a turma estava tumultuando, ao invés de debater”
DESMONTE ALÉM DO IBAMA
Werneck explicou que Salles se concentrou em desmontar o Ibama em março, mas que em janeiro e fevereiro focou em destruir as políticas climáticas do Brasil.
A verba separada para a Política Nacional sobre Mudança do Clima foi encolhida em 96%. Dos R$ 11,8 milhões alocados, restaram apenas R$ 500 mil para que o MMA atenda compromissos já assumidos. A secretaria de Mudança Climática foi extinta.
Em suma, a discussão sobre o clima foi colocada em segundo plano pelo governo. Segundo fala do próprio presidente, “aquecimento global é invenção do “marxismo cultural” - embora o Brasil tenha, surpreendentemente, um modelo de gestão ambiental voltada para o clima que nasceu na ditadura militar, durante o governo Medici.
“Além do negacionismo climático, hoje temos no Brasil um negacionismo ambiental. Temos um ministério anti-meio ambiente”, afirmou Minc.
O ex-ministro alertou também para outra questão: o fato do governo estar liberando mais de um agrotóxico por dia. Nos últimos seis meses, o MAPA aprovou mais de 197 defensivos agrícolas, a maioria já proibidos em outros países por serem comprovadamente cancerígenos. O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos no mundo - 18% do total, o que equivale a 7,5 kg por habitante ao ano.
O governo Temer conseguiu, na gestão passada, todos os recursos necessários para reintroduzir as ararinhas azuis no país - espécie que havia sido extinta pelo tráfico. No entanto, o MMA parou com esse trabalho em fevereiro.
O Fundo da Amazônia também está sendo revisto pelo governo. O Fundo é o maior projeto de cooperação internacional para a preservação da floresta - em dez anos, recebeu mais de R$ 3 bilhões em doações. 99% delas vem da Noruega e Alemanha. O Fundo é gerido pelo BNDES e o valor é doado a estados, municípios, universidades e ONGs. Quanto menor desmate, maior a doação.
Em maio, Salles apontou ter encontrado irregularidades nos contratos do Fundo e implementou mudanças. O Ministro disse que informou aos países sobre as alterações, mas os financiadores negaram que houve qualquer comunicação.
Em carta, Noruega e Alemanha discordaram das alegações de Salles e disseram que “o BNDES faz auditorias anuais que seguem padrões internacionais e que elas são unanimes no reconhecimento do uso eficiente do Fundo.”
As alegações do ministro foram consideradas infundadas tanto pelo BNDES quanto pelos países. Salles rebateu dizendo que “a diminuição do desmatamento associada ao Fundo é uma questão interpretativa”. Isso levou ao afastamento de Daniela Baccas, responsável pelo Fundo no BNDES, e a ameaça da Noruega de parar os repasses se as mudanças não forem revertidas. O ministro reduziu o Cofa (Comitê Orientador para o Fundo Amazônia) de 23 assentos para 7.
Além disso, Salles demitiu em junho a maioria dos membros do Conama (Conselho Nacional de Meio Ambiente). Dos 100 servidores, restaram apenas 23.
A FUNAI, responsável pelo cuidado dos indígenas e quilombolas e de suas terras, foi extinguida e suas atribuições foram transferidas para o Ministério da Agricultura.
O MAPA também assumiu o Serviço Florestal Brasileiro, comandado agora por Valdir Colatto, ex-presidente da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), segundo maior produtor rural do Brasil.
O deputado também é autor do PL 6268/2016, Projeto de Lei que visa criar campos de caça esportiva e comercial, autorizar o abate de animais silvestres inclusive em Unidades de Conservação da natureza, permitir o comércio de animais silvestres, retirar o porte de arma dos fiscais ambientais e flexibilizar sua posse a proprietários de áreas rurais.

O ICMbio (Instituto Chico Mendes da biodiversidade), responsável, como o Ibama, por aplicar multas ambientais a poluidores, desmatadores, garimpeiros e por conservar a biodiversidade brasileira, foi hostilizado por Salles em um evento em Tavares (RS) em maio. Após isso, seus 4 diretores, biólogos e oceanógrafos, foram exonerados e substituídos por militares.
AFRONTA À CONSTITUIÇÃO
Leis e acordos já implementados há anos estão sendo reconsiderados, e os ex-ministros definiram tais cortes e revisões como uma afronta a constituição.
“Na fala e nos atos do presidente e de seus assessores se desqualificam os órgãos, os agentes e as leis ambientais. Estão negando tudo que se foi construído em matéria de legislação”, afirmou Minc.
A Medida Provisória (MP 867), de autoria de Flávio Bolsonaro e Márcio Bittar, consiste em mudar todos os pontos do código florestal - que foi construído ao longo de anos por legisladores e técnicos, e é considerado exemplo para o restante do mundo.
A MP está em tramitação no Congresso e, caso seja aprovada, vai acabar com as reservas legais - que são áreas protegidas em todo o território brasileiro, impedidas de serem desmatadas. Tal alteração permitira o desmatamento de 80% da Amazonia e 35% do Cerrado, entre outros biomas. Isso significaria, apenas, o maior desmatamento do mundo.

“Veja bem, o congresso esta querendo alterar uma lei florestal cuja constitucionalidade foi decidida recentemente pelo Supremo Tribunal Federal”, alertou Carvalho.
REUNIÃO HISTÓRICA

As declarações dos antigos gestores da pasta citadas acima foram dadas em uma coletiva de imprensa pelos oito ex-ministros do Meio Ambiente, que representam os últimos 27 anos de gestão. A reunião aconteceu no dia 8 de maio na USP e foi inédita na história do país.
Existe, entre os ex-gestores das pastas, a conduta de não criticar em grupo o atual representante, porque todos entendem que os desafios e decisões fazem parte de um novo quadro politico. No entanto, os ministros quebraram esse protocolo e se reuniram para escrever uma carta de apelo a sociedade e elaborar ações jurídicas contra Salles por causa da extrema preocupação com o futuro ambiental do Brasil.
Marina Silva, Edson Duarte, Sarney Filho, Rubens Ricupero, Gustavo Krause, José Carlos de Carvalho, Carlos Minc e Izabella Teixeira se manifestaram contra a nova gestão, definida como “uma série de ações, sem precedentes, que representam um desmonte socioambiental, em afronta a constituição”.
Carvalho (governo FHC), definiu que nos primeiros 100 dias de 2019 as decisões tomadas
“fazem parte de uma premissa absolutamente equivocada, intelectualmente pobre e fora de qualquer padrão, que é colocar a questão do desenvolvimento e a questão do meio ambiente como questões excludentes.”
Quando se fala de conservação, ela é tão importante também para a economia. A prosperidade do próprio agronegócio depende de um ecossistema conservado: não é possível desenvolver e crescer a produção agrícola sem solo fértil, água abundante e regime de chuvas equilibrado.
Os conflitos entre O MMA e o MAPA são inerentes. O Ministério do Meio Ambiente é o órgão que, por definição, deveria regular o Ministério da Agricultura,
que, gerido pelos representantes da bancada ruralista, focam em expandir seus negócios, mesmo que isso implique no uso indiscriminado dos recursos naturais.
O atual alinhamento de ambas as pastas é inédito.
De acordo com Marina Silva, ex-ministra do MMA (Ministério do Meio Ambiente) no governo Lula,
“Salles está desmontando todo o sistema ambiental. É a primeira vez que temos um governo que ataca aquilo que é estratégico para qualquer país: a educação e o meio ambiente”.
José Sarney Filho, ex-ministro nos governos FHC e Temer, definiu as ações de Salles como uma
“destruição ambiental, no qual o MMA foi transformado em apenas uma sucursal do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento)".
Na coletiva, Minc pediu que esse patrimônio não seja simplesmente destruído em nome de “uma ideologia muito rancorosa, que parece que o alinhamento com o Trump e que a sede de desmonte falam mais do que a base técnica, legal e institucional.”
ENGAJAMENTO SOCIAL E FUTURO
Rubens Ricupero (governo Itamar Franco) afirmou que a reunião dos ministros foi um ponto de partida, com intenção de se dirigirem a imprensa e mobilizar a sociedade, inclusive aos jovens.
“Queremos nos dirigir a juventude das escolas como na Europa, porque o que esta em jogo é o futuro daqueles que vão experimentar na própria carne as consequências nefastas dessa política completamente irracional a que estamos assistindo.”
Marina Silva reforçou que, no ponto em que chegamos, só será possível uma mudança se ela for legitimada pela mobilização social, e não como ação individual.
“O voto da sociedade foi legitimo, isso é claro. Mas agora caberá a própria sociedade avaliar se quer um Brasil sem floresta, sem biodiversidade, sem recursos hídricos, sem nenhum prestigio internacional e um país no qual o ministro do MMA não pôde receber uma homenagem no Museu de História Nacional por ser considerada pessoa não grata ao meio ambiente.”
Izabella Teixeira declarou que o engajamento social urgente é a única possibilidade de impedir o desmonte socioambiental em curso.
“Se o Brasil vai mudar para uma economia liberal, com um estado menor, vamos discutir a partir disso. Mas nossas diferenças precisam nos unir e não polarizar, ou então continuaremos tendo Brumadinhos, Marianas e outras coisas da vida. Nós estamos olhando a gravidade da situação que se anuncia e que já está posta e precisamos buscar como sociedade formas de contribuir para o futuro do Brasil. A sustentabilidade é a nova expressão do humanismo nesse novo século”.
O manifesto dos oito ex-ministros, disponível na íntegra no site do IEA (Instituto de Estudos Avançados da USP), encerra com a colocação:
“Reafirmamos que o Brasil não pode desembarcar do mundo em pleno século 21. Mais do que isso, é preciso evitar que o país desembarque de si próprio.”
RESPOSTA DE SALLES
Salles divulgou pelo Twitter uma nota de resposta aos ex-ministros publicada no site do MMA. Ele afirma que cumpre a missão “de conciliação da preservação e defesa do meio ambiente em conjunto com o necessário e impostergável desenvolvimento econômico, como determinado por Bolsonaro”.
O ministro também disse ter recebido o manifesto com satisfação, mas alegou que os pontos não indicam nenhum aspecto concreto e específico que coloquem em risco a imagem e a credibilidade internacional do país.
Salles afirmou não ter desconstruído nenhum compromisso assumido e declarou que o MMA vem se dedicando à uma agenda inédita de qualidade ambiental urbana, até então negligenciada. Por fim, o Ministro assinalou que a situação criticada pelos ex-gestores veio como herança das próprias administrações anteriores.


Por Victoria Gadelha
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