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Segregação, preconceito e ausência da democracia: os muros existentes ao longo da orla.

  • Foto do escritor: Turma Jornalismo Impresso
    Turma Jornalismo Impresso
  • 5 de jun. de 2019
  • 3 min de leitura

Atualizado: 24 de jun. de 2019

Julgamentos ocorrem diariamente nas faixas de areia da Praia de Ipanema e do Leblon


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Jéssica e sua amiga curtindo um dia de praia (Foto: Felipe Gavinho)

Jovem, negra, 22 anos e moradora de um humilde conjunto habitacional chamado Cruzada São Sebastião. Essa é Jéssica Borges, frequentadora do Posto 11 da praia do Leblon. A estudante, mesmo morando próxima à orla, notou que era julgada pelos outros moradores do bairro simplesmente por ocupar a mesma faixa de areia e ser negra.


De fato, a praia, apesar de ser um local público, não é democrática. No caso de Ipanema e Leblon, em especial, a faixa de areia é dividida em territórios. As fronteiras são claras, os banhistas que não pertencem aos grupos locais acabam sendo excluídos e se tornam vítimas de olhares e comentários maldosos. É uma realidade diária e que ocorre com mais frequência em grupos menos favorecidos, como a comunidade LGBT+ e os negros.


Eles ficam olhando para gente (Jéssica e suas amigas) como a gente tivesse num lugar proibido. Somos julgadas por passarmos produtos para deixar os pelos do corpo loiros e por pegar sol com biquíni de fita. Eles nos olham com uma cara de “que coisa de pobre”. Lá na Cruzada não dá para fazer isso porque o sol não bate lá direito. Quem dera que eu tivesse uma cobertura para pegar o meu sol e fazer lá tudo isso que faço na praia - afirmou a estudante

Residente do Leblon, Giovana Souza, de 28 anos, não vê problema em dividir a mesma faixa de areia com os moradores da Cruzada. Mesmo assim, a arquiteta consegue perceber que existe um julgamento por parte dos frequentadores, principalmente, do Posto 11.


Tem muita gente preconceituosa em qualquer lugar. Na praia não é diferente, mas não é o meu caso. Para mim, a praia é um lugar para todos e pode vir e ficar onde quiser. Mas tem muita gente por aí que reclama de praia cheia, de não se sentir seguro, acho ridículo - comentou Giovana

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Banhistas no Posto 8 da Praia de Ipanema, zona sul do Rio de Janeiro (Foto: Felipe Gavinho)

No Arpoador, os frequentadores do Posto 7 são uma população fundamentalmente oriunda das favelas tanto da região como de outras zonas da cidade. Isso se dá graças ao fato dos pontos finais dos ônibus se localizarem ali próximo à Rua Francisco Otaviano, além do próprio metrô da General Osório.


Entre o posto 8 e o posto 9, na altura da Rua Farme de Amoedo, se localiza a população LGBT+, que não está só na praia, mas em todo aquele raio do bairro de Ipanema. Já no final do Posto 9 até o 11, há o público que é classificado historicamente como “playboy”. São os mais jovens, em sua maioria, entre 16 e 25 anos. Por fim, a partir do Posto 11 até o 12, se concentra o grupo de maior nível socioeconômico, predominantemente moradores do Leblon.


Alberto Vieira, formado em Geografia pela UFF e professor do Colégio Santo Inácio, afirma que existe um apartheid nas faixas de areia de Ipanema e Leblon.


Ao longo da orla se tem uma construção sociocultural humana muito evidente. De forma aprofundada, essa estruturação pode ser considerada um apartheid urbano da cidade do Rio de Janeiro. Isso é explícito na praia e pouco percebido pela maioria. Porém, fica muito claro para quem para observar esses arranjos - relatou o professor

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Faixas de areia da Praia de Ipanema demarcadas (Foto: Felipe Gavinho)

Além disso, o geógrafo ainda acrescenta que essas divisões nas faixas de areia são negativas se pensarmos em questão de sociedade.


No sentido das relações de poder, das correlações socioeconômicas e socioculturais, esses tipos de divisões não são bons. Há um grau de coexistência limitado, pacífico, mas não há uma interação efetiva. Os territórios estão muito bem demarcados, muito bem estabelecidos e isso, claramente, reflete em um contexto social muito mais amplo, ou seja, além da praia - concluiu o geógrafo

Entretanto, em alguns casos, como o de Jéssica, há o embate entre duas realidades opostas na mesma faixa de areia. Nesse contexto, a jovem frequenta o Posto 11, região que é considerada dos moradores do Leblon, ou seja, grupo de maior poder aquisitivo. Apesar dos muitos olhares, a estudante de 22 anos não consegue se ver longe da praia.


Eu amo esse lugar, eu amo estar aqui no fim da tarde com os meus amigos e com a minha família. E não vai ser um olhar torto que vai me tirar daqui não. Quem quiser olhar que olhe. Acho que a praia é tão minha quanto de qualquer um - finalizou Jéssica

Por Felipe Gavinho

 
 
 

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